A
análise do desempenho dos alunos em testes deve ser uma das ferramentas usadas
para avaliar a eficácia dos professores, mesmo que fatores externos à sala de
aula influenciem os resultados dos estudantes.
Esta é a opinião do diretor do
Centro de Pesquisas em Políticas Educacionais de Harvard e vice-diretor da área
de Educação da Fundação Bill; Melinda Gates, Thomas Kane. Mas ele ressalta: não
basta olhar as conquistas dos alunos nos exames para saber sobre a eficiência
dos profissionais de Educação.
Coordenado
por Kane, o projeto Medições de um Ensino Eficiente, da Fundação Bill; Melinda
Gates, analisa o trabalho de três mil professores nos Estados Unidos usando
também a observação da atuação deles em sala de aula e pesquisas com
alunos.
O
relatório final do projeto ficará pronto em 2013, mas alguns resultados já
foram divulgados. A pesquisa mostrou que professores que, no passado, tiveram
alunos com ganhos de desempenho em testes anuais provavelmente terão, no
futuro, alunos que melhorarão seu desempenho. E revelou que perguntar aos
estudantes sobre seus professores e colocar observadores dentro de sala de aula
são ferramentas úteis para saber mais sobre como os docentes podem melhorar.
Kane,
que ministrou palestra na semana passada em São Paulo a convite da Fundação
Lemann, Fundação Brava e Instituto Fernando Henrique Cardoso, diz que é preciso
avaliar se o pagamento de bônus em dinheiro a professores realmente resulta na
melhoria da aprendizagem.
GLOBO:
Quão difícil é avaliar um professor?
THOMAS
KANE: Ensinar,
assim como aprender, é muito complexo. E, como consequência disso, o ensino
precisa ser medido de múltiplas maneiras. No projeto Medições de um Ensino
Eficiente, que a Fundação Bill e Melinda Gates financia, nós medimos a
eficiência dos professores de várias formas. Olhamos para as melhorias
apresentadas pelos alunos, pedimos para os estudantes nos dizerem o que pensam
dos professores, observamos os professores ensinando em sala e aplicamos testes
que avaliam o conhecimento dos professores sobre o conteúdo. Apenas quando você
combina essas diferentes abordagens é que consegue saber, de forma precisa e
justa, o trabalho que os professores estão fazendo.
GLOBO:
Mas há uma forma de avaliar que seja mais importante que as outras?
KANE: Não sei se
existe uma ferramenta mais importante, mas posso dizer que, se alguma delas não
fosse eficiente, não seria valiosa para o projeto. O fundamental é saber se
essas ferramentas vão ajudar a identificar os professores que farão com que os
alunos aprendam melhor no ano que vem e nos próximos anos. Quando se fala em
identificar os professores que terão estudantes com grandes conquistas no
futuro, a melhor maneira é saber se eles (professores) já tiveram, no passado,
alunos que apresentaram melhoras.
GLOBO:
Como usar resultados de alunos em exames para avaliar professores?
KANE: Nos
Estados Unidos, da terceira à oitava séries, estudantes fazem testes no final
de todos os anos. Com esse teste anual você pode ver dentre os alunos que
frequentaram as aulas na sala de um professor, quão bem eles se saíram no final
do ano anterior. E o quanto eles conseguiram crescer em termos de conquistas
alcançadas neste ano. Há duas coisas importantes. Primeiro: ser capaz de medir
as melhorias alcançadas pelos alunos ao longo do tempo, usando os dados dos
testes anuais. Segundo: ter dados precisos sobre quais alunos estão
frequentando as aulas de professores específicos. Se você tem essas duas
coisas, você pode medir a melhora dos alunos.
GLOBO:É
preciso avaliar os alunos no início do ano e no final do ano e não apenas no
final do ano?
KANE: Sim. O que
você quer é focar no crescimento das conquistas alcançadas pelos alunos e não
apenas no que eles alcançaram no final do ano. As realizações deles vão
depender de como eles estavam quando começaram o ano.
GLOBO:Alguns
críticos dizem que estudantes têm experiências diferentes fora da sala de aula
e que os resultados deles em exames não refletem diretamente o trabalho do
professor...
KANE: Isso é
verdade. Há fatores fora da sala de aula que afetam os resultados dos alunos. É
como um goleiro. Há várias coisas que afetam o número de gols marcados, como a
qualidade do time adversário e os zagueiros do time. Mas a habilidade do
goleiro será um fator muito importante sobre quantos gols foram marcados,
apesar de não ser o único fator. E, no ensino, há outras coisas que
influenciarão as melhoras apresentadas pelos alunos ao longo do ano. Por isso,
é importante medir mais do que apenas as conquistas dos alunos. No entanto,
vimos que o professor, individualmente, tem sim um grande impacto nestas
conquistas.
GLOBO:
Algumas pessoas dizem que, se os professores forem avaliados com base nos
resultados dos alunos, eles não darão muita atenção a estudantes que têm mais
dificuldade em aprender. O senhor concorda?
KANE: Por isso é
que é importante focar no crescimento. Se você mede as mudanças nas conquistas
dos alunos, e não apenas a performance deles no final do ano, então, essa é uma
maneira de conseguir encorajar professores a prestarem atenção a todos os
alunos numa sala, e não apenas nos alunos que têm resultados bons nos exames.
GLOBO:
O senhor acredita que os professores tendem a treinar os alunos apenas a passar
nos testes e a responder perguntas de múltipla escolha?
KANE: Isso é um
perigo real. E, por isso, é importante avaliar os professores por meio de
outras ferramentas que não apenas os resultados dos exames. É importante ter a
observação da sala de aula e saber o que os alunos pensam dos professores.
Aprendemos que se você perguntar aos alunos questões como “Quando você devolve
seu dever de casa, você recebe um retorno útil do professor que vai ajudar você
a melhorar?” ou “Você acha que o professor usa bem o tempo na aula?”, os alunos
podem ajudar a identificar os professores com quem eles estão aprendendo mais.
GLOBO:
As respostas dos alunos sobre os professores surpreenderam?
KANE: Uma das coisas
que nos surpreendeu foi que o grau das respostas dos alunos parecia ser similar
para o mesmo professor.
GLOBO:
Pagar bônus a professores para estimulá-los a melhorar é uma boa medida?
KANE: Sabemos
que existem grandes diferenças entre as melhorias apresentadas pelos alunos com
diferentes professores. O importante é saber a origem dessas diferenças. Elas
são causadas pelo esforço de cada professor, como se um trabalhasse mais que o
outro? Ou elas são causadas pelo talento e habilidades adquiridas? Se você
achar que elas se devem ao esforço, você tem que dar incentivos financeiros com
base nos resultados de testes e em outros fatores. Mas se você acredita que as
diferenças são causadas pelo talento e pelas habilidades, é preciso identificar
de maneira mais cuidadosa quem são os professores mais eficientes, logo no
início da carreira deles. No Estados Unidos, eu acredito que o problema não é o
esforço. Para mim, os professores fazem o melhor trabalho que sabem fazer, mas
não têm as habilidades que precisam para fazer com que os alunos aprendam.
Nesse caso, os incentivos financeiros não vão fazer diferença nos resultados.
Seria interessante pesquisar isso no Brasil, ou seja, saber se dar incentivos
financeiros aos professores implica em uma melhora nos resultados dos alunos.
GLOBO:
Os governos se preocupam o suficiente com a necessidade de avaliar os
professores?
KANE: Atualmente,
vários estados dos Estados Unidos estão tentando reinventar a maneira como
avaliam os professores e como informam os professores sobre seus resultados. No
passado, eles realmente não se preocupavam o suficiente. Para jovens
professores no início de suas carreiras é especialmente importante saber como
estão indo.
GLOBO:
Por que é especialmente importante para professores em início de carreira?
KANE: Este é o
período em que as pessoas estão formando seus hábitos, desenvolvendo uma
maneira de ensinar e em que elas estão mais abertas a sugestões. Além disso,
este é período em que é possível tomar decisões sobre quais professores devem
ser mantidos e quais não devem ser mantidos. Nos Estados Unidos, essa decisão
sobre quem é eficiente ou não pode ser tomada nos dois ou três primeiros anos
da carreira dos professores.
GLOBO:
Professores com resultados ruins deveriam ser demitidos?
KANE: Acho que
deveríamos ter cuidado para que apenas os professores mais eficientes fossem
efetivados após o período de estágio probatório.
GLOBO:
Avaliar professores é algo muito caro?
KANE: Medir as
melhorias de aprendizagem apresentadas pelos alunos e fazer pesquisas com
estudantes não é tão dispendioso. A parte que custa mais dinheiro é ter um
adulto para observar o trabalho do professor em sala de aula. Sei que o custo
da mão de obra é diferente no Brasil e nos Estados Unidos. Mas, nos Estados
Unidos, os órgãos governamentais que estão fazendo um bom trabalho na avaliação
de professores estão gastando 2% da folha de pagamento no sistema de medição.
Investir esse valor é investir em algo valioso e importante. Muitos órgãos
educacionais nos Estados Unidos gastam dinheiro em atividades de treinamento
que, muitas vezes, não terão tanto impacto na melhoria do aprendizado dos
alunos. Fazer uma avaliação bem feita dos professores custa dinheiro, mas é uma
das melhores maneiras de gastar o dinheiro.
Fonte:
DA REDAÇÃO - O GLOBO - RIO DE JANEIRO, RJ
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