A AVALIAÇÃO NO CENTRO DAS TRANSFORMAÇÕES PEDAGÓGICAS


A discussão sobre a avaliação da aprendizagem neste artigo repousa da necessidade permanente trazer a baile reflexões de autores neste domínio focalizando a organização do trabalho pedagógico em sala de aula. Socializar ideias, experiências com base em estudos teóricos confere um marco indispensável no aperfeiçoar da postura sobre a indispensabilidade da avaliação da aprendizagem transformadora. A avaliação transforma? Ela se coloca como espada de dois gumes dependentemente do seu proveito. Esta é a conclusão na qual desembocaram as reflexões.

"Desista de informar e enformar. Liberte seu aluno, e se liberte com ele, da escravidão dos dados estatísticos. Nem tudo pode ser comprovado estatisticamente.
Ame a si próprio, ame seu aluno, ame seu trabalho. Acredite em si, acredite na educação. Seu papel como mestre é educar, e educação é sinónimo de: fé, amor, sabedoria, ação, participação, construção, transformação, problematização, criação, realização. Valorizar faz parte da caminhada? Sim. E rotular, estigmatizar, ferrar, marcar, massificar? Não. Jamais esqueça de conjugar: Eu sou, tu és, nós somos humanos!" (SANT’ANNA, 2010, p.11).
Debater sobre a avaliação referenciando a maneira como tem sido interpretada, utilizada e por vezes descaminhada dos seus âmbitos, quer em sistemas macro, meso e micro dimensional, quer em instituições e em sala de aula por vezes, revela algum conforto teórico justamente pelo fato de que, o debate se configurar mais sobre a prática e não em prática.
Obviamente, à avaliação é reconhecida a sua preponderância significativa na dimensão construtiva que encerra quando se procura, efetivamente, transformar para promover qualidade. Porém, as transformações que dela podem advir também, tiram da zona de conforto os menos interessados em situações óbvia porque, a avaliação em todos os seus níveis procura transparecer tudo que sobre seu crivo recai.
No domínio da educação, em particular da sala de aula a avaliação se mostra complexa, aliás, avaliar é mesmo uma atividade complexa e, isto se evidencia no lidar de seus atores.
Este artigo apresenta-se como tentativa de socializar ideias que brotaram do contato bibliográfico de autores que se dedicam ao estudo da avaliação da aprendizagem, que permearam algumas leituras sobre o assunto.
Portanto, neste pequeno texto, discute-se a avaliação no âmbito micro dimensional, ou seja, a avaliação da aprendizagem, trazendo a discussão as implicâncias desta poderosa arma que se chama avaliação, no centro do trabalho pedagógico.
 AVALIAR PARA TRANSFORMAR
"Emitimos, constantemente, juízo de valor sobre alguma coisa, pessoas, valores. A Escola de nosso tempo deve urgentemente dirigir seus esforços no sentido de sistematizar, tecnificar e humanizar o processo de avaliação (FERMIN, 1971 apud BORDEVANES &al; PEREIRA, 2008)" (grifo do autor).
Na organização e ato do trabalho pedagógico, as relações que se estabelecem tanto vertical e horizontalmente na sala de aula são permeadas de forma denunciada ou tácita pela avaliação na evidência das suas características.
É ponto assente que, estas relações, vertical e horizontal, na perspectiva professor/aluno, aluno/aluno, aluno/professor se advogam na dimensão construtiva, sendo que a verticalidade dessa relação se consubstancie sob a necessidade de haver um regente, uma autoridade no processo de construção e reconstrução do conhecimento. Com efeito, para uma avaliação da aprendizagem expressa num “ato amoroso” (LUCKESI, 2009, p.172) é fundamental que o professor de desarme do autoritarismo e encere os alunos na mesma escala de necessidades onde também ele torne num aprendiz.
O ato de amor é definido pelo autor como “um ato acolhedor, integrativo, inclusivo. Para compreender isso, importa distinguir avaliação de julgamento. O julgamento é um ato que distingue o certo do errado […]” (ibidem).
A avaliação da aprendizagem é um processo sério e mútuo, daí o professor mediador, orientador do processo formal da construção do conhecimento tem de procurar planejar as suas atividades para melhor orientar e orientar-se de acordo com as necessidades que se forem colocando.
Bigge (1977) afirma que a natureza do sistema de avaliação de que o professor faz recurso para avaliar a aprendizagem do aluno influencia em grande medida na qualidade da aprendizagem que ocorre. Neste olhar, o autor faz referência a quatro níveis de ensino/aprendizagem sobre os quais podem ser avaliadas a aprendizagem do aluno em sala de aula: A avaliação a nível de memorização, a nível da compreensão, a nível do desenvolvimento autónomo e a nível da reflexão.
Ora, estes pressupostos acima apresentados, denotam perspectivas diversificadas sob o que se pode perceber como avaliação. Tanto, se pode vislumbrar uma perspectiva assente num ensino por estímulo e resposta, tanto na perspectiva de provocação ou desafio intelectual intencionada no favorecimento de condições para se construir e auto-construir a articulação com o âmbito circundante, o que implica do professor ensinar o aluno a pescar e não a dar peixe já pescado.
A nível da compreensão, o professor recorre a diversas maneiras de comunicação, transmite compreensão ao aluno. Neste procedimento, pode ser notório no aluno a capacidade de exposição de fatos ou explicações dos mesmos demonstrando, desta feita, o quanto é capaz expressar o seu interior.
O desenvolvimento autónomo também é centrado no aluno, no qual a presença do professor é praticamente mais figurativa do que determinante, o que basicamente constitui o modelo de avaliação formativa francês.
O autor destaca ainda que, a avaliação da aprendizagem do aluno a nível do desenvolvimento autónomo cujo professor tem a função de “promover a consciência intuitiva em si mesmo em cada aluno e a expressão artística da auto-realização […] não pode haver um programa de avaliação desenvolvido pelo professor, antes o aluno pode avaliar as suas realizações de acordo com os sentimentos pessoais” (p.358). Esta perspectiva impulsiona a maturidade intelectual. Entretanto, outras se configuram indispensáveis para o destaque da aprendizagem. Nesse caso, a avaliação a nível da reflexão na qual, o aluno é instado a lançar suas posições face as situações que o envolvem direta ou indiretamente, mediante a orientação do professor, fortalecem as suas capacidades.
Ainda na senda de Bigge (1977) refletir sobre situações variadas, despoleta uma perspectiva científica, pois, permite que o aluno pense de forma criativa. A avaliação a este nível é fundamentalmente centrada em problemas circundantes.
É essencial não perder de vista que, a avaliação da aprendizagem deva relacionar-se a aprendizagem do aluno, e este olhar é fundamental na medida em que “é importante enfatizar que o tipo de processo mental segundo o qual o aluno espera ser testado irá determinar seu método de estudar e de se preparar” (BLOOM, 1963, apud BIGGE, 1977, p. 353).
A maneira como muitos professores avaliam seus alunos muitas vezes reflete a maneira como foram avaliados no percurso da sua formação enquanto aluno, ou mostra a maneira como absorvem ou absorveram as experiências das relações estabelecidas. Ademais, parece que, a primeira vista, a intencionalidade dos sistemas de avaliação da aprendizagem fixados pelas escolas destacam uma percepção fundada na perspectiva construtiva quando oculta-a como tal. Tragtemberg afirma que, uma escola fundada na memorização do conhecimento, num sistema de exames que mede a eficácia da preparação para o mesmo, nada provocando quanto à formação durável do individuo, desenvolve uma pedagogia “paranóica”, estranha ao concreto, ao seu fim. Quando falha, “interpreta” este evento como responsabilidade exclusiva do aluno (1982 apud FREITAS (2003, p.86).
O que sucede é que, por vezes quando o professor está na sala de aula, sobretudo professores novos, esquecem o que os estudos aconselham no domínio da avaliação pedagógica, provavelmente por razões inconfessas e que não são objetivos de análise deste artigo.
Captando Cunha percebe-se que: “a questão da avaliação é mais complexa e pode revelar uma certa incompreensão dos objectivos da proposta (inovadora) por parte dos alunos e ou uma certa indefinição quanto à forma e ao modo de avaliar numa proposta diferente por parte do professor […] ambos os sentimentos são próprios à construção do novo” (1998 apud CHAVES, 2001, p.157).
A complexidade de que se reveste a avaliação atravessa os muros da escola. Para além de envolver professores, alunos, direção da escola, atinge os pais e a sociedade. Ora vê-se que, a avaliação também pode ser um ato de mal-entendido conforme destaca Tagliante (2006): “- Entre o avaliador e o avaliado: «Porquê esta nota? Não compreendo, pois, tive a impressão de conseguir uma nota melhor»; - Entre os avaliados: «Eu escrevi a mesma coisa que o (a) colega e ele tem uma nota melhor da minha …»; - Entre a escola e o avaliador: «O professor cuja turma não apresenta maus resultados teme ser conotado como mau professor»; - Entre os avaliadores: «Ah, no ano lectivo passado, vocês tiveram os professores X e Y, por isso, os vossos resultados na me surpreendem»;  - Entre os pais e o professor: «O meu filho (a) vale mais que a nota que você lhe atribuiu … ele (a) está completamente desmotivado (a) por causa da nota que você lhe deu …»;  - Entre os pais e o aluno: «Os teus maus resultados muitas vezes são sinónimos de um mau trabalho»;  - Entre a escola e a representação da instituição ministerial: «É preciso ver os níveis das instituições que crescem a cada ano letivo e cujos critérios de avaliação são poucos transparentes (os palmarés ou níveis das melhores universidades, das grandes escolas…)»;  - Entre o aluno e a sociedade: «Basta ter bons resultados para ter acesso as grandes escolas. Os maus resultados significam muitas vezes que o indivíduo está inapto ao mercado de trabalho»;
Nota-se, por um lado, a complexidade e responsabilidade que avaliação encerra o processo educativo, por outro lado, percebe-se o apelo ao comprometimento que as instituições, os professores, os alunos e os pais devem se revestir perante as várias situações de fórum pedagógico e social oriundos do processo de avaliação.
Pensar nos contornos da avaliação da aprendizagem com vista a minorar os problemas que podem desconcentrar todo um processo, assim como descredibilizar o seu valor, remete ao (re) planejamento e análise permanentes dos processos a ele inerente. Por este e outros motivos, o professor é instado apostar mais e mais no seu aperfeiçoamento pedagógico, na sua formação continuada de tal sorte que esteja a nível das exigências que o envolvem local, regional, nacional e internacionalmente.
O professor deve estar sempre atento as suas tarefas pois, orientar a aprendizagem do aluno o impera estar por dentro de outras áreas do conhecimento (SACRISTÁN & GÓMEZ, 1998). Esta atenção, responsabilidade requerida ganha pernas para andar, se se circunscrever na consciência inconformada da formação inicial ou dos conhecimentos acumulados. De contrário, fica tudo esfumado e como consequência, este professor estará a mutilar ou passar um espírito académico medíocre a seus alunos por se encontrar na periferia dos conhecimentos multidimensionais na medida da dinâmica circundante.
Portanto, atualizar-se não se reduz apenas no apropriar-se de informações veiculadas pela média, é e sobretudo, estar abalizado na construção e desconstrução dos imputes do seu ofício de forma geral e de forma particular estar por dentro da dimensão compreensiva da estrutura mental do aluno com o qual desenvolve a prática pedagógica. Evidentemente, isso demanda o apropriamento, por exemplo, de um arcabouço referente aos âmbitos funcional psicossocial, afectivo, emocional do aluno.
A tarefa do professor é fazer e demonstrar a escola, a sociedade que a sua obrigação não é apenas ensinar o aluno motivado, o aluno fácil, porque isso todo mundo faz. A sua obrigação é reverter o poder do quadro da organização tradicional da escola. Isto é,
o poder da organização escolar, que evidentemente se deriva do sistema político, consiste em fazer de uma criança que se engana nas subtracções, que não concorda o verbo com o sujeito ou não domina o pretérito simples, um mau aluno (PERRENOUD, 1990, apud SACRISTÁN & GÓMEZ, 1998, p.324).
A avaliação da aprendizagem é um exercício permanente que se renova diante de seus embates. Nisso, o professor precisa ter cuidado para não desvirtuar o propósito que ela encerra.
Regra geral, quando o aluno é estimulado a preocupar-se mais com a nota do que com a aprendizagem como tal, isso se reflete no tipo de motivação que o sustenta. Os perigos com esta postura são sobressaídos. Se não, veja-se o que assinala Lwman (2007), a diferença entre o aluno que é orientado para aprendizagem e aquele que é orientado para a nota é que o primeiro normalmente a sua motivação não é externa é mais interna e por conta disso sente-se independente. Para este basta que lhe seja orientado no que tem necessidade com base nos objectivos a alcançar. Já no segundo caso, aluno orientado para a nota, pensa na aula como um conjunto de exigências, expectativas impostas pelo professor.
Neta conformidade, há uma falsa imagem de aprendizagem do aluno, quando, efetivamente, o se passa é apontado por Freitas (2003). Segundo afirma, o aluno fica mergulhado na ansiedade de obter uma nota que lhe possibilita transitar de classe, o que o deixa apenas interessado pela matéria para se sair bem no dia da prova. Esta ansiedade pela nota perpassa a preocupação do próprio aluno, também passa a ser preocupação de seus pais e do meio social envolvente. Portanto, “aprender para “mostrar conhecimento ao professor “tomou o lugar do aprender para intervir na realidade” (p. 40).
A avaliação no centro das transformações pedagógicas deve procurar contrapor esta excessividade conforme apontado na introdução por Sant’Anna.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A avaliação da aprendizagem constitui-se numa alavanca significativa no processo pedagógico quando ela é utilizada para transformar e promover a aprendizagem. O que significa que, tanto o avaliador quanto o avaliado se constituem mutuamente por vezes, trocando os papéis e, isto evidencia a compreensão e a riqueza que esta categoria pedagógica proporciona.
Efetivamente, a avaliação pode ser considerada como espada de dois gumes. Se de um lado promove, reabilita, constrói, de outro, ela pode trazer consequências nefastas notadamente a evasão, a baixa da auto-estima, inclusive o suicídio. Portanto, discutir, socializar as funções e finalidade da avaliação solidifica o adentramento em suas entranhas.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
BORDEVANES, Juan Díaz; PEREIRA, Adair Martins. Estratégias de ensino –aprendizagem. 29ª ed. Petropolis, RJ: Vozes, 2008.
BIGGE, Morris. Teorias da aprendizagem para professores. Tradução: José Augusto Neto e Marcos Rolfini. São Paulo: EPU, 1977.
FREITAS, Luiz Carlos de. Ciclos, seriação e avaliação: confrontos de lógicas. São Paulo: Moderna, 2003.
LOWMAN, Joseph. Dominando as Técnicas de Ensino. Tradução: Harue Avritscher. São Paulo: Atlas, 2007.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar. 20ª ed. São Paulo: Cortez, 2009.
SÁCRISTÁN, J. Gimeno. GÓMEZ. A.I.Pérez. Compreender e Transformar o Ensino. 4ªed. Tradução: Ernani F. Rosa. Porto Alegre: Artimed, 1998.
SANT’ANNA, Ilza Martins. Por que avaliar?: como avaliar? Critérios e instrumentos. 14ª ed. Petropólis, RJ: Vozes, 2010.
TAGLIANTE, Christine). L’évaluation et le cadre européen communParis.CLE international, 2006.

ALFREDO, Francisco Caloia, 2011




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