“A TRADIÇÃO DA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA EM EDUCAÇÃO”


Resenha
Trata-se de um livro de 336 páginas da colecção ciências da educação orientada por Maria Teresa Estrela e Albano Estrela em Portugal. Aparece na perspectiva de contribuir no desbravamento de dificuldades concernentes a estrutura e essência organizacional das etapas na realização de um trabalho científico em ciências sociais e humanas com ênfase em educação como também oferece subsídios cronológicos da pesquisa qualitativa.

É um livro traduzido do inglês americano para o português de Portugal cujo título original é “Qualitative Research for Education” edição 1991 de autores cuja experiência lhes confere a credibilidade merecida. Robert Bogdan e Sari Biklen são professores da Universidade de Syracuse nos Estados Unidos da America.
A obra está organizada em sete (7) partes. A primeira fala da fundamentação da investigação qualitativa em educação: uma introdução, a segunda refere-se ao plano de investigação, a terceira aborda o trabalho de campo, a quarta discute dados qualitativos, a quinta fala da análise de dados, a sexta aborda a redacção da investigação e a sétima e última parte aborda a investigação qualitativa aplicada em educação: avaliação, pedagogia e acção. Cada parte apresenta respectivos itens.
Esta resenha centra-se apenas no item um (1) da primeira parte do livro. Portanto, o item “Tradição da investigação qualitativa” que discute no seu geral a evolução histórica da pesquisa qualitativa em educação abordando os pontos sobre: (i) Origens no século dezanove, (ii) O nascimento da antropologia, (iii) A sociologia de Chicago, (iv) A sociologia da Educação, (v) Dos anos trinta aos anos cinquenta, (vi) Os anos sessenta: uma época de mudança social, (vii) Os anos setenta: investigação qualitativa em educação, a diversidade e (viii) Os anos oitenta e noventa: computadores, feminismos e a investigação qualitativa pós-moderna.
Obviamente pela dimensão do livro, resenhar um item é apenas trazer a relevo uma parte do iceberg de uma obra de grande monta para quem se inicia, e não só, em pesquisa qualitativa em educação.
Na parte sobre a qual repousa esta resenha percebe-se que os autores colocam em evidência o início oficial da pesquisa educacional tradicional a partir do momento em que começaram a surgir apoio à pesquisa educacional em 1954 considerando, no entanto, que a pesquisa em educação advém dos anos remotos.
No ponto “(i) origens do século dezanove” são mobilizadas experiências de pesquisadores que se dedicaram à estudos de campo evidenciando a maneira como se apropriaram de determinadas técnicas qualitativas.
Eles (autores do livro) destacam a experiência do francês Frederick LePlay que se dedicou a estudar famílias de classe trabalhadora, a partir da observação participativa, obrigando-lhe a viver com as famílias durante algum tempo, participou das suas atividades na tentativa de encontrar soluções aos seus problemas sociais à elas inerentes.
Outro pesquisador também referenciado por Bogdan e Biklen, é Henry Mayhew. Este estudou a condição de vida de trabalhadores e desempregados apresentando histórias de vida e entrevistas exaustiva com os pobres.
Ainda é destacado os estudos de Charles Booth direcionados a vida social de pobres londrinos documentando estatisticamente a extensão e natureza da pobreza identificados.
Pode-se perceber que, os autores colocam em evidência a empregabilidade da técnica de observação e entrevista em estudos realizados em diferentes momentos e que obedeceram atenta e organizadamente os procedimentos por estas técnicas estabelecidas. Nota-se também que a questão entre pesquisa quantitativa e qualitativa é tomada no sentido da articulação da matéria quantitativa e qualitativa a partir do exemplo da pesquisa de Pittsburgh em 1907. Assim, Bogdan e Biklen, realçam a percepção da história da pesquisa qualitativa em educação à estudos sociais que se foram desenvolvendo ao longo dos tempos.
Quanto ao “(ii) nascimento da antropologia”, os autores destacam experiências que focalizam os primeiros passos da antropologia e a sua presença na pesquisa qualitativa em educação. O antropólogo americano Franz Boas é destacado como o pioneiro da ponte entre a antropologia e a educação cujos estudos tiveram o corpus documentos e informações coletadas.
Os autores também trazem à discussão antropólogos com experiencias notáveis no domínio da pesquisa qualitativa, tanto é o caso de Bronislaw Malinowski, Robert Redfield, Wax e Margaret Mead. A esta última lhe é reconhecida a primeira aplicação concreta da antropologia à educação pelo estudo do papel do professor e da escola.
Bogdan e Biklen no ponto “(ii) sobre sociologia de Chicago” começam pelo reconhecimento à Albin Small não apenas como fundador do departamento de sociologia da Universidade de Chicago como também pela dimensão conquistada a nível mundial no contributo ao desenvolvimento da pesquisa qualitativa junto de seus colaboradores.
Os autores fazem relatos de experiências de académicos com ênfase à sociólogos que em muito das suas pesquisas recorreram a pesquisa qualitativa na compreensão da realidade das pessoas.
O ponto de partida para percepção do desenvolvimento da “(iii) sociologia da educação” foi a própria sociologia. Partida oficializada em 1915, segundo os autores, com aparição do curso de Sociologia da Educação nos Estados Unidos da América causando, evidentemente, manchete em revista académica.
Entretanto, anos depois da sua aparição, a sociologia da educação fora questionada por revistas sobre a sua cientificidade, isto por não se apresentar com carácter experimental ou seja havia um apropriamento das questões de educação por psicólogos experimentalistas. Parecia haver algum esvaziamento ou uma crise da pesquisa qualitativa na sociologia da educação nesta altura. Bogdan e Biklen reportam citando Peters (1937) afirmando que
à medida que os educadores foram aumentando a sua preocupação com a mensuração, quantificação e predição, as estratégias qualitativas tais como a ‘a investigação em primeira mão’, a utilização de documentos pessoais e a preocupação do investigador de campo social tornaram-se menos relevantes para os educadores (p. 30).
Ora, a tendência de se colocar no cantinho a sociologia da educação foi se verificando inclusive em teses e dissertações de mestrando durante determinada época. Um a outro trabalho de pesquisa abraçava estudo a sociologia e educação ou a sociologia da educação. Porém, se foi recuperando esta crise com o surgimento de trabalhos de fórum qualitativo no caminhar dos tempos.
(iv) “Dos anos trinta aos anos cinquenta” o olhar sobre a pesquisa qualitativa parece começar a ganhar o seu espaço no seio dos pesquisadores. Os autores afirmam que foi aumentando o interesse pela pesquisa qualitativa em educação inclusive pelos antropólogos. Várias contribuições foram surgindo neste tipo de abordagem e parece haver vitalidade no seio de pesquisadores.
(v)“Dos anos sessenta: época de mudança social”, os autores apresentam evolução de como se deu a separação das águas, isto é, se outrora o interesse pela pesquisa qualitativa relacionada à aspectos educacionais era atribuído à sociólogos e antropólogos treinados a se debruçarem sobre aspectos educacionais, nesta época se começa a desenhar pelos próprios educadores possibilidades de por eles se ocuparem da sua área como tal. Vários projetos foram se evidenciando dando, assim, corpo a abordagem qualitativa em educação.
Os autores destacam que a compreensão sobre a pesquisa qualitativa em educação nesta época ganha maior relevo porque anteriormente não era suficientemente evidente aquilo que eles designam o “ modo como os alunos experimentam a escola”. Ademais, há um rompimento da “hierarquia de credibilidade”. Este avanço, se mostra salutar na medida em que se começa abrir o entendimento da pesquisa qualitativa em si e em especial em educação com uma dimensão responsável e responsabilizada.
(vi)“Dos anos setenta: investigação qualitativa em educação, a diversidade”, vislumbra-se um caminhar da pesquisa qualitativa em educação longe de suspeitas dos métodos por si utilizados. Os autores fazem ainda referência ao fato de pesquisadores quantitativos e qualitativos se articularem na consecução dos resultados a que se propuserem. Muitos exemplos são tomados pelos autores no enfoque a esta complementaridade.
No ponto (vii) “os anos oitenta e noventa: computadores, feminismo e investigação qualitativa pós-moderna” os autores reiteram as discussões que se têm travado no que tange a articulação da pesquisa quantitativa e qualitativa, o contributo teórico e prático feminista em pesquisa qualitativa é colocado em evidencia. Outrossim, lançam os desafios da pesquisa no pós-moderno que perpassam a crença sobre a realidade evidente e que demandam refleção detida sobre as estruturas, referencias que estabelecem determinada perspectiva. Nesta era, se assinalar na pesquisa qualitativa a presença do computador com as suas variedades de possibilidades em sofwares para processamentos de textos de análise. Os autores trazem esta dimensão e desafio na pesquisa qualitativa educacional.
Portanto o item “a tradição da investigação qualitativa em educação” aqui proposta por Bogdan e Biklen que se constitui na presente resenha espelha um chamamento consciente na compreensão dos processos da pesquisa qualitativa com ênfase em educação. Assim, não pode passar despercebido a articulação da nossa prática de pesquisa em educação com a dimensão a ela requerida de sorte que se reconheçam o rigor na prática de pesquisa.

BOGDAN, Robert, e BIKLEN, Sari. Investigação Qualitativa em Educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Trad.Maria Alvarez, Sara do Santos e Telmo Baptista. Porto, Portugal: Porto Editora, 1994.                                                
ALFREDO, Francisco Caloia (Junho, 2011)




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