SURGIMENTO DA UNIVERSIDADE EM ANGOLA

A dimensão histórica da Universidade em Angola assenta na UAN por ser a pioneira no Ensino Superior no país.

O historial sobre o qual se desenrola este texto, não pretende buscar necessariamente a componente da investigação científica nos tempos da génese da UAN, mas trazer à tona as etapas testemunhadas pelo tempo no espaço por que ela trilhou para hoje tomar a dimensão de Universidade.

Sabe-se, de forma geral, que a Universidade surgiu no ocidente na Idade Média, construindo deste modo a sua sapiência que em alguns círculos a tornou admirada, receada por alguns e desacreditada por outros. Sob o jugo cultural e económico da Igreja Católica tirando partido do aperfeiçoamento e do desenvolvimento do saber dos clérigos.

As primeiras escolas dedicadas a formação têm o seu palco embrionário na Europa, a academia dirigida pelo filósofo Platão e a criação do Liceu pelo filósofo Aristóteles na antiga Grécia propiciando uma formação à pessoas adultas (andragogia).

Já na África meridional, a historia testemunhou o surgimento de maior parte das Universidades africanas subsaarianas (sendo a Universidade do Cairo (Egipto) e a Alger (Líbia) surgirndo em 1909, a Universidade do Senegal surgiu em 1918 e a Universidade Victória College (Cape Towan, África do Sul) em 1916) depois das independências dos respectivos países na década de 1960.

Muitas Universidades foram surgindo (DA SILVA, 2004) como possibilidade de resgate da identidade e dignidade do povo africano. Entretanto, as Universidades da África Negra (da qual Angola está inserida), alienaram-se ao sistema da educação colonial com estruturas e com modelos do colonizador visto que os seus objectivos estavam bem definidos: formar filhos dos europeus em África e poucos filhos dos autóctones.

Desta feita, “ as Universidades africanas eram instituições de certo modo estranhas ao resto do sistema educativo local e que tendiam a acentuar as clivagens já existentes na sociedade, ao separar os alunos do seu meio local condicionando-os a um meio de vida estranho […]” (THOMPSON,1977 apud DA SILVA, 2004).

Após a independência da maior parte dos países africanos (países da África Negra), os países procuravam proteger (DA SILAVA, 2004) pelo menos dois símbolos nacionais: a bandeira nacional e a Universidade. Esta importância remeteu a que muitos presidentes de países se constituíssem nos primeiros reitores, por exemplo no Senegal fora o reitor Léopold Senghor, na Guiné Conacry o reitor fora Sekou Touré, no Quénia, Jomo Keniatta, na Tânzania o reitor fora Julius Nyerere, na Zâmbia o reitor fora Kenneth Kaunda, em Angola António Agostinho Neto.

Em Angola, a Universidade tem uma história recente se tivermos que comparar com outros países de África. A Universidade angolana fora iniciada em 1962, na altura Venâncio Augusto Deslandes então Governador Geral de Angola. Diante de seu Conselho Legislativo a 04 de Abril de 1962, Deslandes reconhecera a fraca qualidade técnico-científica dos portugueses em Angola, pelo que no ano seguinte se propunha o início do ensino superior em Centros de Estudos universitários, como na cidade de Nova Lisboa (actual cidade do Huambo) e na cidade de Sá da Bandeira (actual cidade do Lubango). Depois de tudo preparado para pôr em marcha as pretensões do Governador Geral de Angola, o Governo central de Portugal considerou as pretensões de Angola como um atentado à Constituição do País o que culminou na demissão do Governador de Angola (Venâncio A. Deslandes) e do seu Secretário provincial da Educação.

Quatro meses depois da exoneração do Governador Venâncio Augusto Deslandes e o secretário para Educação, a 21 de Agosto de 1962 foi publicado o Decreto – Lei n.º 44530 nos termos gerais.

Segundo Manuel (1997) na altura “o Governo entendia ter chegado o momento de instituir o Ensino Superior nas províncias de Angola e Moçambique, coroando assim, de um esforço extremamente honroso levado a cabo no domínio da instrução […]”. Deste modo nascem os Estudos Gerais1 integrados na Universidade Portuguesa.

O processo foi evoluindo e dando lugar a vários cursos e os Estudos universitários de Angola passaram posteriormente à Universidade de Luanda e de Moçambique a Universidade Lourenço Marques.

Essas mudanças registaram-se aos 11 de Dezembro de 1968. Assim, em 28 de Setembro 1976, após a proclamação da independência de Angola, a Universidade de Luanda foi transformada em Universidade de Angola.

A Universidade de Angola passou a chamar-se Universidade Agostinho Neto, no dia 24 de Janeiro de 1985 em memória ao primeiro presidente de Angola e primeiro Reitor da mesma Universidade.

Em 1997 com a realização das primeiras eleições para Reitor e Decanos das unidades orgânicas marcou a democratização da gestão universitária, desta feita foi eleita Reitora a Profª Doutora Laurinda Hyoogard. E em Janeiro de 2002 foi eleito Reitor da UAN o Professor Doutor Eng. João Sebastião Teta, reeleito para um segundo mandato de 2006 à 2010.

Importa ressaltar o facto de que, no primeiro semestre do ano de 2009, o Governo de Angola criou mais seis Universidades Públicas, quando a então única Universidade Pública do país (UAN) ainda caminha abraços com problemas de infra-estruturas dignas e de pessoal docente qualificado para o ensino superior. O problema infra-estrutural é apenas uma das face constrangedoras da Universidade pública.

Na senda das Universidades públicas, actualmente Angola soma sete Universidades públicas estabelecidas por regiões académicas específicas.

Ora, este virar de página do surgimento de seis Instituições de ensino superior público em Angola, por um lado, provavelmente trará mais trabalho, devolvendo deste modo a qualidade ao ensino superior, o seu lugar na sociedade e o comprometimento sério e palpável dos reitores, decanos, regentes, docentes e discentes em relação a tríplice: ensino, pesquisa e extensão.

Ademais, não percamos de vista que esta reforma do ensino superior público deve fitar no seu contributo concreto às necessidades do país, criando uma competição salutar entre elas (Universidades públicas) e as Universidades privados que muitas vezes, estas últimas, são conotadas de empresas mais mercantilistas do que académicas com os olhos pontos apenas no lucro.

A cultura de participação desapaixonada, da elite académica nacional, nas questões do país, do continente e do mundo em geral, apregoa prestígio merecido as Instituições do país, como também a confiança e competência dos docentes.

Por um lado, diga-se em abono da verdade, que muitos académicos universitários ainda andam calados, parecendo anestesiados e como se estando a espera um dia serem chamados para ministros. Por outro lado, constrange-me imenso quando me apercebo que há tanta gente com títulos académicos aqui em Angola, e quando é necessário discutir ideias sobre esta ou aquela matéria eles não aparecem. Talvez com a existência das sete universidades públicas, vai-se atenuar a cobardia de muita gente com títulos académicos no contributo imprescindível rumo a solução dos problemas nacionais.

Quanto ao redimensionamento do ensino superior público angolano parece-nos que este veio acabar com a democratização da gestão universitária, ao desfazer-se da via eleitoral dos reitores e decanos passando doravante a serem nomeados pelo Presidente da República. Este quadro, dá-nos a ideia de que a Universidade estará aquém da autonomia do poder político nacional. Embora, o Estado seja o proprietário das Universidades, deve ser o Estado a sustentar as instituições públicas, sem no entanto impor as linhas de gestão.

A postura governamental em doravante indicar os reitores das Universidades públicas, tende por um lado, denunciar e a permear à conveniências hegemónica do partido no poder (MPLA) e vetar a possibilidade de académicos nacionais qualificados que não caem na graça do partido no poder serem gestores Universitários, até porque a classe académica e científica ainda está atrelada a classe política. A ser assim, enraíza-se a subordinação das Universidades angolanas às ideologias político-partidárias.

Desta feita, fica de longe vermos na Universidade um espaço de livre manifestação do espírito, o que torna difícil a geração actual e talvez também a futura, compreenderem profundamente, assumirem e empreenderem mudanças necessárias para o desenvolvimento do país.

Entretanto, o Prof. Doutor Paulo de Carvalho (nomeado reitor da Universidade Katyavala Bwila) em entrevista ao jornal O País em 2009 citado pelo site folhadeangola), de entre outras abordagens diz que a democracia no ensino superior tem a ver fundamentalmente com a participação dos diferentes actores na gestão académica das instituições […] ou será que, por não haver eleição dos gestores nas instituições estatais de ensino superior americanas e francesas (por exemplo), não haverá democracia nessas instituições?

Concordamos que a democracia no ensino superior deve assentar-se numa participação colectiva. Porém, o académico não descarta ao todo a nossa apreciação. Será que a realidade de Angola é sensível a este propósito a que se refere P. de Carvalho? De um lado, nos parece que a responsabilidade da gestão académica não estará completamente sobre os auspícios da participação activa dos diferentes actores das instituições, mas aos interesses de quem governa o país onde os ideais político-partidário parecerem sobreporem-se aos ideais académicos, pois, na maior parte dos gestores tenderão salvaguardar a confiança que lhes foi atribuída para estarem bem com o poder. De outro lado, a idoneidade da democracia das instituições estatais americanas e francesas e dos próprios países, estão de longe da democracia angolana. Não será que também, com está decisão de não mais eleger os reitores, decanos poderá de certa medida vir galardoar apenas os professores do comité de especialidade do MPLA do ensino superior?

Outrossim, é importante que os reitores não caiam na tentação de transformarem-se em apenas gestores dos orçamentos das Universidades e do património, que também explorem ao máximo as potencialidades das regiões onde estão destacadas.

Também, nos que o grande calcanhar Aquiles nas Universidades angolanas e da Universidade Agostinho Neto (UAN) em particular é a ausência da produção científica pela mão própria. E com o redimensionamento da UAN, com o surgimento de mais seis Universidades públicas, estas cumprirão verdadeiramente o seu papel se primeiro, não se olhar o professor como alguém contratado apenas para dar aulas; segundo, os reitores devem manter vivo o pensamento segundo o qual o desafio essencial seja a capacidade de produzir conhecimento científico e não agarrar-se aos títulos como que por si só garantissem a competência produtiva; terceiro, impõem-se a transformação dos professores em professores pesquisadores constantes para que tenham sempre o que ensinar e possam divulgar as suas pesquisas.

Portanto, isto implica que, os professores sejam acariciados, o que os tornaria em pedra basilar para a qualidade e desenvolvimento das Universidades. Todavia, não se deve negligenciar a propiciação de condições de todas as dimensões para a produção própria e profícua à sociedade. E assim, os professores as Universidades estarão aptos a pleitear com colegas de qualquer Universidade do mundo.
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1 A designação “Estudos Gerais” deveu-se ao facto de a província de Angola, naquela altura, servir apenas para a formação de quadros na parte geral da formação, cabendo a parte específica à Portugal.
Referência
1-DA SILVA, Eugênio A. Alves. O burocrático e o politico na administração universitária, continuidades e rupturas na gestão dos recursos humanos docentes na Universidade Agostinho Neto (Angola). Braga. Fundação para a Ciência e a Tecnologia, 2004.
2- MANUEL, Carlos Mariano. O Ensino da medicina em Angola. Servicio de Publicaciones de la U. A. H, 1997.
3-http://www.folhadeangola.com/noticia.php?id=1489 (Acesso aos 20 de Agosto de 2009)

By Fr. Caloia ALFREDO
21/05/2010

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