BREVES REFLEXÕES SOBRE O CONCEITO DE CURRÍCULO DE FORMAÇÃO DO PROFESSOR

Pensar na formação inicial de professores figura das grandes linhas para dotá-los de competência e habilidades no exercício da sua prática pedagógica. E obviamente, relança a qualidade do próprio processo educativo, colocando o professor apurado para vários desafios que se colocam tanto dentro quanto fora da escola.
Neste texto, procura-se apresentar um diálogo preliminar com alguns autores versando o mesmo, na percepção e enquadramento da realidade que se apresenta.
Lançar ideia básica na discussão de currículo de formação de professores com vista a construção de competências que permitam assentar o perfil de saída docente, envolve um conjunto de questionamento que respondidas podem reunir percepção que influenciem a prática de formação de professores. Por exemplo, qual deve ser o currículo de formação de professores? Que características deve possuir o currículo de formação de professores?
Considerando as afirmações de Stenhouse (1984 apud SACRISTÁN, 1998) estas, colocam dois pontos de vista diferentes sobre a questão de currículo: o currículo intencional e o realístico. “Por um lado, é considerado como uma intenção, um plano ou uma prescrição, uma ideia acerca do que desejamos que acontecesse nas escolas. Por outro lado, é visto como estado de coisas existentes nelas, o que de fato acontece nas mesmas”.
Neste pensamento, evidentemente, colocam-se dois desafios, primeiro sobre o que gostaríamos que fosse efectivado e segundo sobre o contraste com o que a realidade objectiva nos apresenta resultante das suas peculiaridades. Assim, a compreensão do currículo real requer esclarecimento de âmbitos práticos de onde é elaborado e desenvolvido, de contrário estar-se-á a margem da realidade.
Nesta senda, Sacristán (2000) e Stenhouse (1984) apresentam considerações interessantes, na medida em que, o primeiro considera o currículo como “ o cruzamento de práticas diferentes e se converte em figurar, por sua vez, de tudo o que podemos denominar como prática pedagógica nas aulas e nas escolas”. E o segundo afirma que “um currículo é uma tentativa para comunicar os princípios e traços essenciais de um propósito educativo de forma tal que permaneça aberta à discussão crítica e possa ser transferido e efectivamente para a prática”.
Mobilizar princípios e traços de um propósito educativo numa diversidade de práticas abertas ao aperfeiçoamento constante torna a prática pedagógica mais rica. Assim, entendemos o currículo como um campo prático onde são colocadas em acção propósitos educativos.
O currículo de formação de professores deve procurar potencializar as acções docentes de sorte a educar e socializar as práticas de ensino por intermédio de actividades organizativas.
De acordo com Whitty e Bates (1985, 1986 apud SACRISTÁN, 1998) o que a escola ou os professores transmitem não pode constituir-se numa cultura ou conhecimento vazio limitados no seio restrito escolar longe das práticas quotidianas, pois, a cultura ou conhecimento não podem ser visto como objecto terminado e que mecanicamente é passado de uns para outros, mas como actividade mediatizada que se reproduz em construção e se reconstrói pela aprendizagem e condições em que esta se realiza.
Destacar o impacto do currículo de formação de professores pressupõe levar em linha de consideração momentos em que alunos e professores vivenciam experiencias nas quais constroem e reconstroem conhecimentos e saberes em referência à prática (MOREIRA, 2009; SILVA, 2008). Deste modo, parece importante considerar-se que a elaboração do currículo de formação de professores, dos programas de disciplinas, além de reflectir a realidade objectiva também devem procurar estabelecer uma interligação ou conexão entre si, expressando uma cultura. E destacando Sacristán (1998) “ a cultura contida nos currículos já formulados ou planejados para a escola sofre outra série de modificações quando se desenvolve num seio escolar concreto, em contexto que poderíamos chamar internos”.
Deste modo e, na senda do autor referenciado, a cultura do currículo é mediatizada por actividades ao longo de um processo no âmbito de uma formação o que implica dizer também que, a mediatização que se estabelece pode tornar-se fonte de distorção dos propósitos originalmente manifestos.
Parece-nos não fazer sentido confinar o ensino simplesmente no que os programas oficiais (escolares) apresentam e no que os professores se propõem a transmitir. Esta consideração é descabida na medida em que “ uma coisa é o que dizem aos professores que devem ensinar, outra é o que eles acham ou dizem que ensinam e outra diferente é o que os alunos aprendem (SACRISTÁN, 1998). Assim, o que se obtém da articulação do que se ensina e do que se aprende forma o que o autor chama de currículo manifesto que na experiência evidenciada fruto da interacção integrativa dos elementos envolventes percebendo assim o currículo real.
Num conjunto diversificado de definições, Rule (1973 apud SACRISTÁN, 2000) considera currículo como guia das experiências que o aluno obtém na escola, como conjunto de responsabilidade da escola para promover uma série de experiencias, sejam aquelas aprendidas de forma planejadas e dirigidas, sejam as não intencionais com vista a provocarem mudanças nos alunos ou ainda por se alcançar determinados intentos; outrossim, o currículo também é definido como a definição de conteúdos da educação, como planos, programas de escola que abraçam conteúdos e actividades, especificação de objectivos que se traduzem nos saberes que o aluno venha obter.
Identificar e caracterizar o perfil de saída docente tendo como ponto de partida documentos, planos programáticos, por si só reflectem uma visibilidade diminuta da realidade objectiva do que a escola, alunos, professores na prática precisam na garantia da percepção e resolução dos problemas reais. Isto se se tiver em linha de consideração a Escolas de Formação de Professores. Nesta lógica, Goodlad (1984 apud SACRISTÁN, 1998) destaca que “ após a análise de projectos, documentos e propostas curriculares, não são metas o que nos falta para a escola, mas a articulação das mesmas e o compromisso com elas”. Nesta óptica, adequar projectos, documentos e propostas curriculares remete a desenvoltura de competências profissionais e a reflexão permanente da realidade prática.
Considerando a dualidade constituinte do currículo: currículo extensivo e intensivo (DEMO, 2008a), denota-se que a eficiência do currículo de formação de professores é lúcida na segunda proposição, porquanto, o currículo intensivo “ opta pelo aprofundamento metodológico e propedêutico principalmente sem descuidar dos conteúdos, centrando o trabalho do aluno na pesquisa e elaboração própria”, tendo o saber pensar como acto permanente que gravita em torno da prática da pesquisa como prioridade da aprendizagem do aluno e professor (DEMO, 2008c). O currículo extensivo está confinado no dar aulas em que a relação professor/aluno é estereotipada, um está para dar aulas e outro para aprender.
Ora, a formação de professores destacada numa situação de escolarização mobiliza um conjunto de competências que permitirá o desenvolvimento de actividades acometidas no fazer docente e no exercício da cidadania enquanto elemento integrante e comprometido com o bem humano.
As competências adquiridas e requeridas do professor evidenciam saberes teóricos e práticos (ALTET, 2001; ZABALA; ARNAU, 2010) demonstrando competências para ensinar (PERRENOUD, 2000) e competência como saber competir (DEMO, 2008a, 2009).
A reflexão sobre o currículo de formação de professor deve acompanhar a dinâmica da sociedade, adequar e fortalecer a cultura dos actores da prática educativa.
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© ALFREDO, Francisco Caloia. 2010

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