AVALIAÇÃO DAS APRENDIZAGENS: SENTIDOS NA CONFIGURAÇÃO DA ACTIVIDADE PEDAGÓGICA

Nas suas diversas abordagens, a avaliação constitui desafio constante e presente nas reflexões e práticas de especialistas e professores no quotidiano da prática pedagógica. É ponto assente que, avaliar fenómenos sociais, como a educação, é uma actividade complexa que envolve a articulação de muitas perspectivas na promocação da aprendizagem.
O processo de ensino/aprendizagem proporciona aos seus actores motivos sobre os quais exige-se avaliar para a posteriori tomar decisões no almejo da qualidade que possibilita a actuação na e em sociedade com eficiência e autonomia.
A avaliação da aprendizagem no processo de ensino não significa exclusivamente olhar a evolução ou estagnação da aprendizagem do aluno, das condições de aprendizagem ou a selecção de técnicas e instrumentos a submeter, implica também reflectir sobre a prática do professor como avaliador na sala de aula, interprete e articulador do sistema de avaliação das aprendizagens. Para tanto, um conjunto de procedimentos não deve ser descurado no quadro da prática da avaliação na sala de aula. Não se trata simplesmente de valorizar instrumentos como paradigmas de questionamento e reflexão sobre a aprendizagem dos alunos, pois, a ser assim, estar-se-á a negar a essência da própria avaliação no âmbito educativo.
A avaliação da aprendizagem configura-se como promotora de sentido na intervenção às decisões do sistema de ensino da prática da actividade docente. Nesta conformidade, o seu valor pedagógico se consubstancia na regulação e auto-regulação das actividades. A sua relevância consiste na percepção clara do sustento do paradigma não classificatório para uma melhor aprendizagem alicerçada na avaliação mediadora.
Reflectir em torno da realidade objectiva da avaliação das aprendizagens figura-se, evidentemente, numa tarefa difícil e complexidade. Pois, esta prática permeia o quotidiano pedagógico, como encerra em si factores intrínsecos e extrínsecos inerentes aos atores. Para tal, várias perspectivas de abordagens podem envolver a sua discussão: o desempenho do aluno nas diversas áreas do conhecimento, as actividades avaliativas do professor no processo de aprendizagem e os resultados obtidos pelos alunos, a importância que o professor atribui à interacção com o aluno no decurso da prática pedagógica, enfim (SÁ BARRETO e PINTO, 2001).
A avaliação não pode simplesmente permear as discussões, os contextos, procedimentos ou estruturas das actividades já realizadas, ela deve ser posicionada na dinâmica de comunicação permanente em que o professor e o aluno se constituem mutuamente (SOBRINHO, 2008,p.194). Nisto, vê-se que é preciso olhar para a avaliação como um meio impulsionador à aprendizagem, assumindo características condizentes ao modelo construtivista (SÁ BARRETO e PINTO, 2001).
E quando a questão tem a ver com o processo de formação de professores parece ser bom, conforme dizem Sordi e Ludk (2009) entender a aprendizagem da avaliação como necessidade estratégica, onde a autoavaliação e a avaliação devem ser exercícios permanentes dos pares. Desafio que concorrerá para o aprimoramento da prática de ensino do professor avaliar bem com e seus alunos. Esta prática desencadeia na nutrição da qualidade do próprio ensino.
É crível que, a qualidade de ensino está ligada a aspectos vistos de forma atenta, nomeadamente a competência profissional do professor, a transmissão dos conteúdos, a apropriação activa dos conteúdos escolares e as condições laborais. E o favorecimento destas considerações se parecem assentar em uma escola democrática caracterizada assim por "(…) possibilitar a todos os educandos que nela tiverem acesso uma apropriação ativa dos conteúdos escolares. A prática docente deve criar condições necessárias e suficientes para que a aprendizagem se faça da melhor forma possível. Isto implica criar ou desenvolver meios efetivos pelos quais os educandos de fato aprendam os conteúdos que estão sendo propostos e ensinados (LUCKESI 2009, p.65).
A preocupação de possibilitar os alunos à possessão de conteúdos de forma dinâmica e mediadora deve estar no centro das atenções da prática educativa dos professores. E a avaliação surge para dar forma a este exercício da prática. É nesta linha de pensamento que se pode aferir que o propósito da avaliação reside da necessidade da qualidade da aprendizagem do aluno. Assim, o autor acima referenciado afirma que “a avaliação é um juízo de qualidade sobre dados relevantes, tendo em vista uma tomada de decisão”. Três variáveis são tidas em conta de forma indissociável:
1º Juízo de qualidade: por expressar a qualidade do objecto que está sendo ajuizado. Entretanto destaca-se, segundo Luckesi, também um juízo sobre o aspecto substantivo (juízo de existência) que pode ser justificado pelos dados empíricos da realidade, nisto configura-se a essência do objecto. E o juízo de qualidade tem por objectivo exprimir qualidades que se atribui a um objecto;
2º Dados relevantes da realidade: para se determinar a qualidade de um objecto deve-se começar por identificar as suas características. No processo de aprendizagem de condutas e manifestas pelos alunos, estas são satisfatórias na medida em que se aproximam das expectativas que se alimentam desta conduta na aproximação a que se vê como padrão ideal;
3º Tomada de decisão: o ato de avaliar completa-se nesta fase. É preciso que se tome decisão sobre o objecto possibilitando um juízo satisfatório ou insatisfatório. Isto tem uma implicância nas acções a posteriori de continuação ou modificação. A avaliação das aprendizagens com incidência no aluno visa essencialmente estabelecer passos subsequentes na sua aprendizagem resultante do reflexo satisfatório ou insatisfatório.
A definição clara do padrão de qualidade de conduta que se espera da aprendizagem do aluno é importante na medida em que todas as acções desenvolvidas ou a desenvolver serão determinadas no ideal de expectativas estabelecidas.
Vista a avaliação como parceira da aprendizagem e não como conjunto de instrumentos de medição dos conhecimentos do aluno simplesmente com valor classificatório, ela se torna num meio de preocupação permanente do professor no sentido de ajudar o aluno a aprender bem e a desenvolver competências e habilidades requeridas.
Nesta senda, o verdadeiro significado da avaliação permite ao professor estar atento ao andamento dos seus alunos, verificando a eficiência do seu trabalho, e os desvios que está tendo. E este processo ajuda o aluno a se dar conta do seu nível de aprendizagem no circuito das suas actividades escolares ciente das suas necessidades e limitações (LUCKESI, 2009, p.83).
É evidente que, a questão da avaliação tem sido aflorada com preocupações inovadoras no propósito de se melhorar a qualidade de ensino e da aprendizagem. No contexto sobre o qual incide este estudo parece haver a manutenção do valor classificatório da avaliação justificado pelas condições reais de trabalho (contexto da Escola de Formação de Professores em Angola). Não é menos certo considerar que a carga punitiva atribuída a avaliação nas actividades em sala de aula reflecte a prática tradicional, característica da escola antidemocrática. Neste olhar, é menos crível falar-se de uma avaliação mediadora, porquanto, esta exige estar muito tempo com o aluno (HOFFMANN, 2009, p.29). Ademais, Hoffmann refere que uma postura diferenciada em avaliação exigirá compreender que a aprendizagem pressupõe experiências vivenciadas pelos sujeitos o que torna os elementos da ação educativa, únicos e individuais em seus entendimentos e desentendimentos a pesar de sofrerem um mesmo processo educativo (2009,p.115).
A necessidade de se formar profissionais em educação competentes de forma inicial e continuada e capazes de contribuir para um sistema de ensino cada vez mais qualitativo não constitui puramente desígnio singular do professor, mas, muito mais que isso.
A prática da avaliação tradicional justificada por circunstâncias de vária índole no quadro do processo educativo realístico remete o professor atrofiar e se descartar da função de ajudar o aluno a aprender, a transpor barreira de avanço ao conhecimento. A tarefa facilitadora do ensino pressupõe, ao professor, incorporar na sua reflexão não apenas a prática individual como experiências colectivas da instituição e pares proporcionando deste modo a compreensão da realidade envolvente na garantia de uma transformação qualitativa. Sendo que, a avaliação relança o professor a melhor orientar, guiar o aprendizado do aluno. Neste quadro, a aprendizagem supõe a observância de duas exigências complementares segundo considera Astolfi (1990, p.87-88), é preciso que o mestre se adapte ao aluno, se faça epistemólogo de sua inteligência, estando atento as eventualidades de sua história pessoal, e é precisamente porque o mestre terá gasto tempo para isso que ele estará à altura de confortar o aluno com alteridade, de ajudá-lo a se superar (apud HOFFMANN, 2009,p.119).
É incumbência que a avaliação deve abrir-se mais para lá da utilização de instrumentos de medição ou verificação, o que demonstra limitação nas suas pretensões. E como constata Sobrinho (2008, p.202), as práticas de medida e meras constatações não engendrando possibilidades de questionamentos por reduzirem reflexões e acções tomam uma configuração procedimental conservadora.
A tentação de tornar a avaliação da aprendizagem algo conservadora ou estática motivada por razões óbvias adia o sucesso e a qualidade de aprendizagem. Também, se parece óbvio o facto de que, a avaliação conservadora não se compadece com a qualidade de ensino, da aprendizagem e da própria avaliação. Segundo Sobrinho (2008) a avaliação deve ser sobretudo um processo dinâmico que se inscreve no movimento dos demais processos educacionais, especialmente aqueles abertos a vida social e com carácter participativo. Deve refletir sobre processos, contextos, produtos, estruturas, causalidades e metas, pôr em questão os significados das ideias e das ações pedagógicas dos valores das práticas e das políticas educativas e de seus efeitos na formação dos cidadãos e da sociedade, em vista de transformações e aperfeiçoamentos necessários e socialmente desejados (p.203).
Todas as vezes que compreendemos a finalidade da avaliação, as evidências da realidade da prática pedagógica convergem para a sua transformação por se perceber que a avaliação deve referenciar várias realidades. E ainda neste quadro Ardoino e Berger (1989) enfatizam a ideia da dinâmica da avaliação relançando o pensamento segundo o qual a avaliação é plurireferecial, múltipla, aberta, enquanto o controle é monorrenferencial, único, fechado. A avaliação à medida que se desenvolve promove operações de questionamentos heterogéneos, isto é, produz sentidos sobre múltiplos e diferentes aspectos de uma realidade complexa no caso da educação (1989 apud SOBRINHO, 2008).
Uma das características que deveriam adoptar as escolas seria olhar para a avaliação com o espírito colaborativo dos pares. Esta também é uma das formas de viver o ensino numa aprendizagem permanente. A aprovação de mudança numa cultura da avaliação no dizer de Ludke e Sordi (2009, p.316) “ implica entender e usar a avaliação como estratégia organizadora dos múltiplos olhares e acções sobre a realidade na perspectiva de produzir melhorias”. Esta postura caracteriza a escola comprometida com a aprendizagem de seus alunos. Não é menos verdade que, o exercício da heteroavaliação deveria permear a prática da actividade pedagógica para reforço da qualidade avaliativa e fortalecimento das experiencias. Parece que a discussão em torno da avaliação das aprendizagens teria maior substância na medida em que os professores deixassem de ser exclusivamente os avaliadores e se tornem também objecto de avaliação das suas práticas na sala de aula, estando desafiados com o desenvolvimento de relações mais maduras com a avaliação e com os avaliadores de seu trabalho (LUDKE & SORDI, 2009,p.316).
É verdade que, por vezes ouve-se de professores, dificuldades em viver o usar a avaliação como trabalho pedagógico a desenvolver na sala de aula justificando-se por razões intrínsecas ou mesmo extrínsecos a estes. Nas palavras de Lantheaume reportadas pelas autoras acima é transparecida o desafio do trabalho docente, os docentes afirmam não poder bem fazer o seu trabalho: os alunos resistem ao trabalho de estimulação do professor, os colegas são pouco cooperativos, a administração impede-os de trabalhar. O risco da pessoa se empenhar demais coexiste com o do descomprometimento. O primeiro impede a clivagem protectora entre as esferas doméstica e profissional provocando desgaste ou exaustão profissional. Para além de que se torna irrisório devido o desfazamento entre o sobre-empenho e os resultados decepcionantes dos alunos. O segundo aumenta as dificuldades de uma atividade em desenvolvimento (2006).
Este é um desafio colocado na perspectiva de se perceber quão complexo é o processo educativo e quanta responsabilidade se é requerida para lidar e enfrentar fenómenos educativos e pedagógicos.
A escola é lugar idóneo onde os educadores podem trabalhar juntos para enfrentar situações difíceis e consolidar boas ideias no ensino. A escola é o lugar onde a reflexão crítica não é uma dialética passiva, e sim um paradigma de conhecimento e “re-conhecimento” dentro de um contexto de ação. A escola é mais do que um lugar onde se ensina a pensar criticamente, também é o lugar para pensar criticamente sobre a educação (SIROTNICK apud LUDKE & SORDI, 2009,p.312).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1- HOFFMANN, Jussara. Avaliação mediadora: uma prática em construção do pré-escolar à universidade. 30ªed. Atual ortog. Porto Alegre: Mediação, 2009.
2- LUDKE, Menga. SORDI, Mara Regina Lemes de. Da avaliação da Aprendizagem à Avaliação Institucional: aprendizagens necessárias. In: Avaliação Campinas Sorocaba São Paulo, v 14. p 313-336, Julho, 2009.
3- LUCKESI, Cipriano Carlos. A avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições. 20ª ed. São Paulo: Cortez, 2009.
4- SÁ BARRETO, Elba Siqueira. PINTO, Rergina Pahim (org). Avaliação na Educação Básica (1990 - 1998). In: Série Estado do Conhecimento nº4.FCC. MEC/Inep/Comped. Brasília-DF, 2001.
5- SOBRINHO, José Dias. Avaliação Educativa: Produção de sentidos com valores de formação. In: Avaliação Campinas Sorocaba, São Paulo, v 13 n.1 p 193-207 Março, 2008.


© ALFREDO, Francisco Caloia, 2010. In Projecto de Pesquisa “ Avaliação das Aprendizagens: A experiência da Escola de Formação de Professor Cte Liberdade no quadro da Reforma Educativa de Angola”.




1 comentário:

  1. Oi, Francisco.

    Vim fazer uma visita. Vou olhar com carinho, porque parece ser um espaço muito bem cuidado.
    Parabéns.

    Marlene

    ResponderEliminar